sábado, 19 de agosto de 2017

Dificuldades de aprendizagem ou medo de aprender?



Qual será o motivo para uma criança ter dificuldades em aprender? Serão só problemas cognitivos ou existem múltiplos factores que condicionam o processo de aprendizagem?
Existem duas grandes fontes de dificuldades para a aprendizagem, a de natureza instrumental e a de natureza psíquica. No que diz respeito às dificuldades de natureza instrumental, encontramos:
  • A instabilidade psicomotora, que implica quer movimentos motores parasitas que impedem a criança de se concentrar numa determinada tarefa ou inibições extremas que levam a criança a fechar-se em si mesma ou até mesmo adormecer
  • Défice de referencias de identidade, que ocorrem quando uma criança tem falta de referencias culturais, língua, raízes, ou filiação. Esta falta de suporte dificultam a comunicação, e o processamento da informação faz-se de forma insegura, provocando na criança e adultos que a circundam uma má avaliação das suas capacidades cognitivas.
  • Pobreza de estratégias cognitivas, quer isto dizer que a criança foge e evita qualquer actividade de elaboração intelectual, ou seja sempre que lhe é colocada uma questão que implique esforço mental recusa-se a utilizar os mecanismos intelectuais que tem.
Quanto às dificuldades de natureza psicológica temos:
  • Baixa tolerância à frustração, implica que a criança viva com excessiva intensidade qualquer insucesso escolar que tenha. Para se ter uma boa capacidade de aprendizagem é primeiro necessário a interiorização de limites e regras, aprender a lidar com as incapacidades de forma a poder ultrapassá-las, aceitar ser julgado e comparado. A ilusão de que já se sabe tudo e que faz sempre tudo bem é prejudicial. No entanto o salientar em demasia os insucessos, lembrando sempre à criança que não consegue, ou exigindo-lhe tarefas acima das suas capacidades também não é facilitador do processo de aprendizagem. Vai provocar um enorme mal estar que leva a criança a desistir precocemente originando perda de auto-estima e desvalorização de si mesma.
  • Não ter uma boa distancia relacional com a autoridade, isto acontece quando a criança tem uma proximidade tal com o professor que a leva a pedir ajuda permanente, solicitando a sua exclusividade e afeição ou então a provocar, contestar, não se deixando conduzir no processo de aprendizagem.
  • Não se mobiliza o desejo de saber (dentro do contexto escolar - não quer dizer que não o faça fora deste contexto), isto é, quando uma criança renuncia ao desejo de saber escolar direccionando a curiosidade para o campo pessoal.
Para aprender não basta a inteligência e a memória, tem que necessariamente existir uma “determinada organização psíquica e pessoal . Uma criança que devido à sua história pessoal de vida não tenha referencias culturais de base, sofra de grande instabilidade psicomotora, tenha uma baixa tolerância à frustração ,com uma má distancia relacional com os educadores poderá originar que em determinadas alturas ela evite utilizar as suas estratégias cognitivas, e desta forma não mobilize o seu desejo de aprender, porque assim irá evitar a frustração do insucesso e consequentemente o sofrimento que isso lhe causa. Estas crianças protegem-se de pensar, porque têm um medo enorme de aprender.
Ser pedagogo:
“Ter suficiente disponibilidade psíquica para conseguir responder a todos estes pedidos de auxilio pervertidos pela procura afectiva e pela provocação, sem romper o diálogo, sem se sentir ferido, sem se tornar sádico, sem se deixar manipular, sem soçobrar na demagogia ou no deixar andar... capacidade que o professor terá de desactivar, por vezes até desintoxicar, todos esses sentimentos parasitas que se ligam à situação de aprendizagem e a pervertem” (Boimare, 2001).